Marítimo 2 - 0 Benfica
- Filipe Pires
- 29 de jun. de 2020
- 3 min de leitura

Eu venho do interior do Alentejo. Nasci numa cidade do interior do Alentejo, passei os primeiros anos numa vila do interior do Alentejo, e vivi os últimos 20 anos entre uma aldeia do interior do Alentejo e Faro. Durante o tempo que passei exclusivamente no interior do Alentejo, o meu acesso a Futebol ao vivo era bastante limitado. Resumia-se, muito rapidamente, a jogos inter-turmas, jogos inter-escolas, Solteiros Contra Casados, Campeonato da INATEL, e Campeonato Distrital. E no entanto, este ajuntamento de jogadores do Benfica com jogadores do Marítimo foi o pior jogo de Futebol que vi na minha Vida. E atenção que a lista contém jogos em que eu próprio participei, bem como um jogo mítico, em que uma das equipas entrou com 8 e acabou com 10, porque houve jogadores a atrasar-se e foram entrando à medida que iam chegando.
Não estou com isto a dizer que o Benfica merecia ter ganho. Nem lá perto. O que estou a dizer é que, esta noite, nenhum dos integrantes dos dois conjuntos de jogadores que estiveram em campo, merece dizer que pratica a mesma Arte que Eusébio, Cruijff, Iniesta, Pelé, Maradona, os dois Ronaldos e Nosso Senhor Lionel Messi.
Nesse mesmo Alentejo interior, é comum dizer-se que uma misturada sem sentido é uma tourada. Mas este jogo, tendo sido uma misturada sem sentido, não foi exactamente uma tourada. Porque no fim da tourada, o toureiro, depois de duas horas de sadismo, ao menos tem a decência de acabar com o sofrimento do bicho. Já o senhor Hélder Malheiro, ao fim de duas horas de sadismo para com os adeptos, resolveu continuar a coisa mais cinco minutos, por motivos que ninguém entende. Mas também, com todas as decisões que ele tomou a partir da meia hora (para os dois lados), prolongar o sofrimento de 14 milhões de inocentes não parece assim tão grave. Entre essas decisões, contam-se a primeira falta marcada por mau estado da relva, e a primeira falta marcada por incredulidade. Porque o senhor árbitro teve tanta dificuldade como nós em acreditar que o André Almeida tinha ganho um lance em velocidade, e por isso resolveu parar o jogo, para evitar algum rompimento no contínuo do espaço-tempo.
O Mestre André que, como não podia deixar de ser, voltou a marcar a sua posição na nossa História. E se há pais que podem dizer aos filhos que viveram o desembarque na Normandia, a batalha de Iwo Jima, o ataque a Pearl Harbor ou os bombardeamentos de Hiroshima e Nagasaki, eu vou poder dizer aos meus filhos que testemunhei um horror superior a todos esses: o André Almeida a bater um livre à entrada da área. E nem foi dos piores que vi a tentar nos últimos tempos, mas é um claro sinal que, nos Barreiros, chegámos ao fundo do caldeirão. E eu sei que não se deve misturar Futebol com política, mas tenho alguns problemas com a direita que gostava de enumerar aqui: o monetarismo, o nacionalismo, o racismo, o fascismo e todos os nossos jogadores que hoje estiveram nesse lado do campo. Da frente para trás, começamos pelo Jardel. Numa forma de jogar que chama os centrais a assumir a saída com bola, o nosso septuagenário com metade dessa idade, teve hoje a destreza e o discernimento de um septuagenário com toda essa idade, quando sai do internamento ou vai para a porta do lar fumar um cigarro às escondidas.
Fazendo como qualquer extremo e passando pelo nosso lateral-direito como se ele nem sequer lá estivesse, encontramos um pouco mais à frente o Luís Miguel. Que hoje, como um músico em digressão de fim de carreira, resolveu voltar em força aos clássicos. E enquanto o tivemos em campo o Luís de Bragança, foi possível vê-lo a atirar-se para o chão quando dominava mal a bola e um adversário lha tirava, e vimo-lo também a ser solidário e a não deixar ninguém de fora. Mesmo que fossem adversários que ele tinha acabado de tirar da jogada, o nosso Luís tomava sempre a decisão que voltava a incluir o seu colega no jogo. A juntar a isto, fez mais cruzamentos do que o Chuck Norris consegue contar, para o sítio onde devia estar há já algum tempo: fora de campo. Mas a esquerda não esteve melhor, a presença do Cervi é que ajudou a disfarçar a auto-estrada que ali tínhamos aberta. E sim, num corredor que tem um lateral com 1,83m e um defesa central com 1,93m, teve que ser um anão com 1,65m e umas olheiras que fazem lembrar o Rasputin a meter ordem na casa. E assim que ele saiu, o Nanu fez com a nossa ala esquerda o mesmo que as senhoras da peixaria me fazem com as douradas: abriu-a ao meio, para ser mais fácil de comer.
CARREGA BENFICA!!
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