Anita Vai Aos Festivais
- Filipe Pires
- 16 de ago. de 2019
- 3 min de leitura

Como já tem 15 anos, Anita já é grande e adulta e já pode ir aos festivais de Verão. Mesmo conhecendo apenas meia banda em todo o cartaz, Anita junta-se aos seus amigos grandes e adultos, para que todos viajem em conjunto num comboio que os leva a um destino exótico chamado Outros Sítios Além Das Cidades.
Juntamente com os seus amigos, Anita faz parte da geração que pode ir aos festivais porque os pais pagam a viagem. E na maioria dos casos, o bilhete também. Esta é uma geração em que existe a liberdade para experimentar e sair, porque também existe muito mais facilidade de contacto. É comum para a geração de Anita que os pais os vão buscar os sempre que eles saem, seja a que horas for ou seja onde for. É também comum que Anita e os amigos não reconheçam o esforço que os pais fazem para os ir buscar de madrugada, poucas horas antes de irem trabalhar, assumindo os jovens que os pais não os deixam ir para casa a pé por obrigação e não por preferirem isso a ter de lhes dar dinheiro para o transporte. Mesmo que os pequenos não entendam, esta é a opção que sai mais em conta, porque o dinheiro do transporte iria com certeza ser gasto em bebida e depois fazia-se a mesma despesa duas vezes.
Esta é, como diz a geração imediatamente anterior à de Anita e seus amigos, a geração dos mete-nojo. Porque a geração anterior podia no máximo ir às festas da aldeia. E ia com hora marcada para voltar.
Chegados finalmente ao recinto do festival, Anita e os amigos procuram um sítio para o seu T4 de lona, que vão procurar instalar num sítio com alguma terra, mas o mínimo possível. Anita e os amigos fazem isto para se sentirem ligados à natureza e para serem super rebeldes, mas sempre sem sujar a roupa. Porque vão ter de estar impecáveis para todas as fotos tiradas por eles próprios ou pelos fotógrafos do festival. Montado o acampamento, os pequenos mostram que, por muito que mudem os tempos, o ser humano vai continuar sempre a ser um macaco de imitação. E por isso, tal como as gerações anteriores à sua, deixam um rasto de lixo muito maior que o do cartaz que vão ignorar nos dias seguintes. É importante parecer super ligado à terra, mas Anita sabe bem que há pessoas que são pagas para limpar o lixo dos outros.
Os festivais são muitas vezes sítios de novas experiências e de quebra de barreiras. Mas não em relação a álcool, porque de bebida está Anita farta. Foi na sua primeira ida a um festival que Anita experimentou, isso sim, substâncias psicotrópicas. Fez a sua primeira incursão no Mundo dos estupefacientes. Estreou-se nos efeitos das drogas de abuso. Fumou umas ganzas. A Anita foi a um festival e fomou umas ganzas. De imediato sentiu a sua consciência a expandir-se e o seu estômago a contrair-se da fome que lhe deu. Como a sua alimentação nas 24 horas anteriores assentou exclusivamente em latas de conserva e álcool, Anita precisou de ser socorrida pelo INEM nessa noite, tendo depois aparecido em milhares de perfis de redes sociais a dizer que foi minada, enquanto dois pacientes Bombeiros se continham para não lhe darem o par de estalos de que ela tão urgentemente precisava. Este vídeo gerou, como sempre, indignação em quem gosta de se indignar, risos em quem gosta de se rir e uma ou duas crónicas de tipos que acham que sabem escrever.
Assim que chegou a casa depois do seu primeiro festival e do seu primeiro contacto com as drogas, Anita descarregou - para nunca mais ouvir - toda a discografia de Richie Campbell. Porque os amigos lhe disseram que ele é o maior músico de reggae que alguma vez existiu.
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