Suas Santidades, As Velhas - Que Estrabucho É Este?

Este texto é dedicado às velhas. De corpo, de mente e dementes, as velhas. De todas as cores, credos e origens porque eu não sou racista, ao contrário das velhas. E fica já aqui um forte abraço a todas as velhas que tomem conhecimento deste texto por meias palavras de outras velhas, ou "fontes minhas" como as velhas lhes chamam.

Frágeis, débeis, respeitáveis. Donas de uma verdade à prova de bala, porque a bala fica presa no ninho de cegonha cheio de laca a que as velhas chamam cabelo. Sabem tudo, vêem tudo e são a prova quase viva de que a língua é o músculo mais forte do corpo humano, porque depois de os outros músculos atrofiarem, a língua das velhas continua a conseguir levantar o peso de uma boa invenção sobre a vida dos outros dois que andavam a passear o cão e que de certeza que são daqueles casais que dá agora nas notícias, ou sobre as duas "amigas" que vivem no 3º Frente do prédio duas ruas atrás e que devem ser fofas ou lá como é que isso se diz. E se vier a desgraça de um confronto entre as velhas e a verdade que elas inventaram, com certeza não foram elas que o disseram. As outras velhas sim, essas é que sabem tudo e o que não sabem inventam. deus livre e guarde as velhas de se meterem na vida dos outros.

Porque as velhas também são santas, como se não bastassem já tantos defeitos. As velhas vão à igreja ao Domingo para ouvirem a palavra do senhor. Do senhor que está sentado duas filas à frente e que disse qualquer coisa sobre ir buscar uma miúda para irem passear à tarde e divertirem-se, por isso aquele deve andar metido com alguma moça mais nova. Mal sabe ele que a mulher andava com outro na rua no outro dia. Alguém disse que era o filho adolescente, mas as velhas não sabem quem é esse Lescente, só sabem que a mulher ia com outro e agora o marido está a dar-lhe a paga. Via-se logo que aquele casamento não ia longe, o mesmo casamento em que as velhas estavam a tirar fotos e a dar beijinhos a duas pessoas que ficaram a pensar porque é que a outra tinha convidado as gárgulas da igreja para a cerimónia.

As velhas decidem o destino do Mundo num passeio matinal sem andarilhos nem artroses (mais ninguém está acordado, por isso não há ninguém para ter pena delas) ou sentadas numa mesa de café enquanto reclamam dos galões que estão escaldantes ou gelados, ou das fatias douradas que deviam ter mais açúcar ou ter passado menos tempo a fritar. Sim, falo por experiência própria. Neste Mundo, apenas uma fonte de conhecimento é mais fiável do que as fontes das velhas: a televisão. É na caixa que as velhas aprendem o (pouco) que ainda não sabem, a não ser que os ensinamentos discordem das velhas, porque aí são baboseiras ditas por aquele que andou metido com a outra. Aquela, a coisinha. Pois essa, que também não é boa rés.

Como eu disse ao princípio, este texto é dedicado às velhas. Às velhas em estado de velha, às velhas em estado de novas e às velhas em estado de homem. Continuem a ser velhas, o Mundo precisa de espectadores que se acham os actores principais.